Em uma escala razoável de trabalho, da ordem de 1 para 100 mil, 1,2 milhão de quilômetros quadrados do território nacional ainda são totalmente desconhecidos. Essas grandes lacunas geográficas foram olhadas do espaço pela última vez há mais de 30 anos, na época do Projeto Radam (Radar na Amazônia), em escalas bem desfavoráveis para as necessidades dos dias de hoje.
?O Brasil desconhece o Brasil?, resumiu Gilberto Câmara, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em sessão na 3.ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, encerrada na última sexta-feira, em Brasília. Esses grandes hiatos de conhecimento espacial, entretanto, não anulam os avanços obtidos pelo Brasil com o projeto Satélite Sino-Brasileiro de Observação da Terra (Cbers). As imagens captadas pelos satélites são usadas em várias aplicações. ?No monitoramento das unidades de conservação, para a identificação de situações fundiárias e assim por diante?, disse Câmara.
O grande trunfo das imagens do Cbers, segundo o pesquisador, está no fato de serem totalmente públicas. ?Uma imagem digital, quando disponibilizo para interessados, por exemplo, continua sendo minha também?, explica o pesquisador, respondendo a críticas sobre a abertura pública das imagens. ?O tempo máximo de retorno para um pedido de imagem do Cbers é de dez minutos. Por que não se faz isso com todos os outros dados? Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Segurança Pública dos estados ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) devem ser bens públicos?, defende Câmara.
O fato de a repetitividade de informações também ser possível, pois os satélites passam por uma mesma região de tempos em tempos, permite que os dados sejam ferramentas importantes para o combate ao desmatamento da Amazônia, por exemplo.
Nas grandes malhas urbanas brasileiras, como em São Paulo, também existem áreas desconhecidas, mas por outro motivo. ?Quando ocorreu a privatização das empresas de energia elétrica e de telecomunicações, os dados, principalmente das zonas periféricas das grandes cidades, onde o mapeamento já estava feito, ficaram em poder das empresas. Essa cartografia não é pública?, explica Câmara. Além de preencher os grandes vazios de conhecimento, o pesquisador do Inpe também defende a necessidade de que o futuro da tecnologia espacial brasileira seja discutida a partir de agora. ?É preciso saber qual é o tamanho que queremos para o nosso programa. Teremos que resolver isso.?
Mesmo com o lançamento dos próximos Cbers, previstos para 2006 e 2008, o Brasil não terá ferramentas, por exemplo, para identificar áreas de agricultura com muita precisão. ?Para isso, é preciso um satélite com resolução de 5 metros com freqüência de 20 dias, ou de 50 metros que passe de dois em dois dias pelo mesmo lugar?, explica o pesquisador. Para Câmara, o Brasil pode pensar em tecnologias como essas somente para daqui a dez anos, ?quando isso será perfeitamente viável, inclusive em termos de custos?, afirma.