Busca pela democratização da informática

É comum entender como inclusão digital a democratização do acesso à informática para toda a população, mas em geral iniciativas de inclusão de pessoas com necessidades especiais são relegadas a um segundo plano. Dos raros colégios para alunos com problemas neuromotores em Curitiba, segundo a diretora da Escola Especial Vivian Marçal, Suely Hieda, apenas a instituição em que trabalha tem começado a utilizar recursos de informática adaptados às necessidades de estudantes com limitações motoras, desenvolvidos por professores e alunos de mestrado da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e do Centro Federal Tecnológico do Paraná (Cefet-PR).

A grande dificuldade que existe na escola é a falta de computadores para os alunos. Conforme Suely, há somente três máquinas, uma em cada sala de aula. ?O ideal é que existisse um computador por aluno?, afirma.

Suely explica que a utilização de computadores facilita a aprendizagem de alunos com necessidades especiais. ?O uso de recursos computacionais proporciona a autonomia do indivíduo, pois através de programas adaptados às limitações dos alunos eles podem expressar o próprio pensamento, construir suas identidades sem serem induzidos pelos professores?. Suely diz também que há uma considerável melhora cognitiva, mas para que haja resultados é preciso que os alunos estejam motivados.

Recursos e adaptações

Os três softwares livres desenvolvidos numa parceria entre PUCPR e Cefet-PR – financiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – usados no Vivian Marçal são conhecidos como Prancha Livre, Editor de Prancha e o Emulador de Teclado e Mouse (ETM), o ?teclado virtual?.

A Prancha Livre é um recurso utilizado para alunos que ainda não foram alfabetizados. Traz símbolos que representam verbos, pronomes e substantivos que podem ser combinados, formando frases gráficas.

Com o Editor de Prancha, o professor pode editar os símbolos que deseja e imprimi-los para usar sem a necessidade de computador. Isso facilita o acesso do recurso educacional para alunos que não tenham computador em casa.

O ETM funciona por varredura e simula o teclado ou o mouse na tela do computador. O sistema de varredura opera com um quadrado amarelo que vai passando sobre os símbolos na tela, e quando está sobre a letra desejada, o aluno pressiona um mouse adaptado. O ETM possui um aplicativo que faz previsão de palavras baseado em estatísticas, o que contribui para acelerar a escrita dos usuários. Como o dispositivo simula também o mouse, o usuário pode usá-lo para navegar na internet.

Segundo a coordenadora pedagógica da instituição, Zélia Mendes, o ETM tem sido usado como alternativa para alfabetização. ?Aprendizagem com o computador acontece bem mais rapidamente?, afirma.

Sem ruídos

Suely afirma que, após a introdução de recursos de informática para a aprendizagem, ficou muito mais fácil de perceber o retorno do aluno.

Capacidade intelectual desenvolvida

Aos 30 anos, a escritora Adriana Gumz tem 22 livros infantis publicados, o que poderia não ser considerado algo muito impressionante, não fossem as condições em que as obras foram feitas. Adriana sofre de paralisia cerebral que impede o movimento voluntário de braços, pernas e língua, mas que não limita suas capacidades intelectuais.

Até que começasse a usar uma interface de computador, fruto de pesquisa empírica do avô Raimundo Gumz, em 1997, ela já havia escrito sete livros, através de pranchas que contêm as letras do alfabeto. Para escrevê-los, ela necessitava da ajuda de outras pessoas, que iam indicando as letras da prancha. Adriana acenava com a cabeça quando chegava a letra desejada. ?Eu demorei uns três anos, mas consegui adaptar um computador para ela poder ser independente e desenvolver o talento?, afirma Raimundo, ótico de profissão.

Para que ela conseguisse expressar suas idéias, o avô fez um painel com dez números, que, através de um programa desenvolvido por um conhecido, permitia a Adriana escrever. ?Bastava que ela pressionasse duas teclas, para que o computador reconhecesse uma letra ou um comando. Por exemplo, ao digitar 3 e 8, ela tinha a letra A. Para o comando ?gravar?, ela tinha outro código?, explica Raimundo. Mas, as dificuldades motoras prejudicavam bastante o desempenho de Adriana, o que levou Raimundo a pesquisar outros dispositivos.

Então, em 1998, ele melhorou a interface do computador com a ajuda de um software especializado e uma espécie de ?mouse de cabeça?. O mouse consiste numa almofada com um sensor que fica atrás da cabeça de Adriana, que quando pressionado com a nuca, dispara a função ?clique?. O software traz um teclado virtual que funciona por sistema de varredura, fazendo um papel semelhante ao de uma pessoa que ficasse indicando as letras. Toda vez que é indicada na tela a letra que Adriana deseja escrever, ela pressiona a cabeça no ?mouse-almofada?. Os dispositivos facilitam o trabalho dela e é dessa forma que Adriana continua escrevendo suas obras até hoje.

Evidentemente que escrever dessa maneira não é uma tarefa rápida. Segundo a mãe da escritora, Lizete Gumz, ela demora cerca de seis meses para compor um de seus livros. ?Mas dependendo da obra pode demorar até cinco anos.? (RD)

Instituições criam novas adaptações

Adaptações para usuários com problemas motores causados por paralisia cerebral vêm sendo desenvolvidas há algum tempo por pesquisadores ligados à PUCPR e ao Cefet-PR. Segundo Percy Nohama, doutor em Engenharia Biomédica e professor responsável pela parceria entre as instituições, estão sendo desenvolvidos protótipos de mouse que podem ser acionados com movimentos da cabeça, além da criação e melhoria de softwares livres para controle das interfaces computadorizadas.

A fim de atender pessoas que tenham perdido o controle do movimento dos braços, foi desenvolvido pelo aluno Ronie Weslei Muller um modelo de mouse utilizando sensores ultra-sônicos, que são acoplados em um ?boné? e no computador. Com a movimentação da cabeça, o ponteiro do mouse também se move na tela.

Outro projeto para mouse substitutivo foi feito por Jefferson Osowsky e Nelise Dias, no Cefet-PR, e permite também que com o movimento da cabeça se possa acionar o ponteiro do mouse. Nesse projeto, a diferença é que se utiliza como sensor uma câmera para captar um ponto colorido no ?boné? do usuário. Segundo Nohama, estão também sendo realizadas atualmente pesquisas para que seja possível deslocar o cursor do mouse com o movimento do olho.

O pesquisador diz que no exterior mouses que possam ser movimentados com a cabeça já são comercializados, mas como o mercado para esses dispositivos é restrito, eles possuem um alto custo. (RD)

Ferramentas de auxílio

O Grupo Imago do Departamento de Informática da Universidade Federal do Paraná (UFPR) deve lançar no segundo semestre uma primeira versão de um CD que disponibilizará ferramentas para auxiliar portadores de necessidades especiais. Segundo o professor que coordena o projeto, Luciano Silva, o CD trará recursos desenvolvidos pelo grupo, como o Mouseloupe – uma espécie ?lente de aumento?, que amplia partes da janela por onde passa – que já foi concluído, além de outros dispositivos, como reconhecedor de comandos através da voz. O projeto é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação Araucária e conta com a participação de três bolsistas da graduação.

O Mouseloupe permite não só ser usado com facilidade, mas também melhora a digitação e a navegação na internet, para quem tem deficiência visual. Funciona com o sistema operacional Linux, que estará também incluído no CD e será instalado automaticamente assim que inserido e começar a rodar no computador. ?Procuramos facilitar ao máximo, para que usuários não tenham dificuldades para instalar o sistema?, diz. O dispositivo é um software livre, disponível na página: http://www.inf.ufpr.br/imago/mouseloupe) (RD)

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