O que antes significava um espaço para divulgar ideias e interagir com pessoas sobre diversos assuntos, os blogs estão tomando proporções que transcendem as discussões online e já adentram às esferas penais e cíveis. Isso porque as postagens dos autores e os comentários de terceiros estão infringindo a lei, principalmente no que diz respeito à honra de pessoas, de instituições e até mesmo de órgãos do governo.

continua após a publicidade

Um exemplo aconteceu na última semana, em Maringá, onde Ministério Público (MP) precisou intervir no caso de um blogueiro acusado de difamar personalidades da cidade. De acordo com o MP, o responsável pelo blog poderia responder criminalmente pelos comentários de leitores, acusado de incitação ao crime. O blog foi retirado do ar depois de uma decisão da Justiça.

“Colocaram num blog que eu abandonei a minha mãe e o meu irmão em um outro estado. Mas eu nunca tive irmão”, conta o também blogueiro Ângelo Rigon, uma das pessoas que teria sido lesada pelos comentários. Rigon conta que o blog em questão fez um certo sucesso porque usava a polêmica para atrair a atenção do público local e abria brechas para que os comentários maldosos fossem postados. Segundo ele, os comentários atingiam profissionais de várias áreas.

Segundo Rigon, em um dos casos implicou em danos morais e materiais para os responsáveis e funcionários de um salão de cabeleireiros na cidade. “O blog falava que na verdade era um estabelecimento de fachada e que ali funcionaria uma suposta ‘casa de massagens'”, afirma. Além de terminar encerrando as atividades do salão, com a consequente perda de empregos, Rigon conta que os comentários implicaram em separações de casais.
Rigon conta que o blog de notícias de Maringá mantido por ele também já foi alvo de comentários ofensivos oriundos de leitores. Segundo ele, em 2007, o espaço para comentários foi usado para divulgar opiniões racistas. No entanto, ele considera altamente discutível a responsabilidade do blogueiro por comentários alheios.

continua após a publicidade

O advogado especialista em Direito eletrônico e propriedade intelectual, Alysson Oikawa, alerta que tudo o que é publicado, mesmo os comentários de terceiros, é de responsabilidade do autor do blog. Por isso é preciso fazer uma filtragem não só dos textos mas de todo o conteúdo multimídia. “Existem pessoas que agem de má fé e utilizam os espaços para cometer crimes contra a honra. Neste caso, como a internet não encontra barreiras geográficas, o impacto negativo para a imagem de uma pessoa ou instituição pode tomar proporções irreparáveis”, afirma.

No caso de o blogueiro receber alguma notificação, ou ser simplesmente comunicado quanto a um conteúdo que atenta contra a honra de outros, Oikawa explica que é importante que o material em questão seja retirado do ar imediatamente. “Se a pessoa tomar as medidas para evitar o mau uso do seu espaço ou não manter uma postura indiferente a um comunicado, ela dificilmente deverá ser responsabilizada”, diz. No entanto, se o blogueiro se mantiver inerte, o advogado alerta que os tribunais podem condena-la por responsabilidade solidária. “Isso vale para blogs e comunidades virtuais”, comenta.

Expressão e interação

continua após a publicidade

Objeto de preocupação para alguns, para outros os blogs são uma oportunidade de expressão e interação com a sociedade. O fato é que os blogs têm se proliferado em todos os níveis sociais e já podem se considerar uma das grandes peças de comunicação atualmente.”É um novo movimento, o movimento dos sem mídia”, conclui o blogueiro e jornalista Fábio Riesemberg. Para ele, o blog veio para ficar já que proporciona uma posição à população de poder comunicar de forma mais ampla. “O blogueiro mais simples pode ter o mesmo poder dos grandes veículos”, diz.
,
Para Riesemberg, o conceito de blog também está mudando. Para ele, o que antes parecia ser assunto de adolescentes está sendo valorizado por empresários e políticos. “A impressão que dá é que o blog é mais informal e por isso aproxima mais o leitor do autor”, comenta. Riesemberg, que alimenta o blog esquentadinho.blogspot.com, conta que começou como um projeto informal, como um espaço de desabafo. Posteriormente, ele afirma que começou a postar textos sobre assuntos ligados ao meio ambiente e ao bem-estar depois de se envolver com adeptos da bicicleta. “Agora estou tendo mais respostas. Com um sistema de estatísticas grátis que baixei dá para ver que o espaço está a cada dia com mais frequentadores”.

A opinião é comungada pelo empresário da área de softwares, Ernesto Haberkorn. Para ele, que esteve em Curitiba na última semana para o lançamento do seu décimo livro, que fala sobre software de gestão empresarial,
os blogs possibilitam a exposição e lucro de produtos que, a princípio, não são um hit de mercado. “Para a distribuição de cultura, os fóruns e blogs inteligentes contribuem para a democracia. O importante é o governo e
o Judiciário não se omitirem e que haja de fato punição para quem usa estes espaços de modo errado”, afirma.

Delegado alerta que quem usa o “diário eletrônico” para denegrir imagem alheia pode ser punido

Se para os autores dos blogs a legislação confere a responsabilidade sobre todo o conteúdo postados nos seus respectivos espaços, para quem os usa para denegrir a imagem de alguém de forma anônima, a punição é mais viável do que muitos possam imaginar. De acordo com o delegado do Núcleo de Combate aos Cibercrimes (Nuciber), Demetrius Gonzaga de Oliveira, existem meios para identificar a origem e o autor de um comentário a princípio apócrifo.

Segundo Oliveira, é possível identificar o usuário de internet através do endereço de Internet Protocol (IP) – um conjunto de números que aponta o local de um computador em rede pública ou privada. “Hoje podemos identificar um infrator do ciberespaço de forma muito rápida”, afirma.

O delegado conta que a atuação da polícia no sentido de coibir as infrações online tem conscientizado os usuários e o volume de ocorrências tem caído. Segundo ele, o site de relacionamentos Orkut concentrava o maior número de denúncias. “Antes eram feitos de 2 a 3 boletins de ocorrência por dia. Quem estava incidindo nestas infrações entendia que não seria localizado. Presenciamos casos de pessoas se exibindo com armas e fotos de pedofilia. Hoje o pessoal está tomando mais cuidado”, diz. Segundo o advogado especialista em direito eletrônico e propriedade intelectual, Alysson Oikawa, ao postar comentários cujo objeto sentir-se lesado, o autor pode ser condenado
tanto na esfera penal quanto na cível. Neste último caso, além da retirada do blog do ar, a pessoa que se sentir lesada pode pedir indenização por danos morais. “Se a pessoa comprovar uma perda material, uma demissão, ou um divórcio, o responsável pelo blog, mesmo não sendo o autor do comentário pode arcar com o prejuízo”, diz.

Para quem que entender que houve dano por conta de comentários na rede, Oikawa orienta que é preciso estar munido de registros e objetos que possam servir como provas ou tenham efeito jurídico contra o ato criminoso. “Nossa orientação é de que a pessoa compareça a um cartório e solicite o que chamamos de ata ou declaração notarial. O cartorário vai acessar o espaço pela internet, vai descrever o conteúdo ou fará um print screen e irá expedir uma declaração”, afirma. Isso porque, segundo Oikawa, “o conteúdo ofensivo pode estar no ar hoje e em dez dias não está mais, porém o dano já foi feito e vai ser difícil comprovar a publicação”.