Um estudo realizado pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) ilustrou informações contidas em publicações da área no exterior. De autoria do psiquiatra Alexandre Martins Valença, o trabalho verificou que mulheres com transtornos psicóticos são mais suscetíveis a cometer assassinatos, principalmente envolvendo familiares.
De acordo com a Sociedade Paranaense de Psiquiatria, apenas 1% da população mundial sofre com o distúrbio. Essa também é a média de casos no Paraná e no Brasil.
Para chegar a tal constatação, Valença conta que trabalhou com 30 pacientes do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Heitor Carrilho, no Rio de Janeiro. “Todas elas recebiam tratamento por já terem cometido homicídio, tentativa de homicídio ou estarem envolvidas em algum ato violento. Foram ao todo 30 mulheres, mas o estudo se focou em oito: sete com esquizofrenia e uma com transtorno esquizoafetivo. A maioria delas apresentava baixo nível de escolaridade, era solteira, não tinha atividade profissional e apresentava baixa renda familiar na época do delito”, explica o membro da ABP.
De acordo com os resultados da pesquisa, cinco mulheres apresentaram sintomatologia psicótica no momento da avaliação. O psiquiatra constatou também que as alucinações auditivas foram os sintomas psicóticos mais comuns (50% deste grupo) e que, quando as próprias pacientes foram questionadas sobre a existência de sintomatologia psicótica na época do delito, quatro afirmaram sofrer esse tipo de alucinação, o restante negou.
“A negação nesses casos realmente acontece. A pessoa não tem uma crítica em relação à necessidade de procurar ajuda e afirma ainda não ter nenhum problema”, conta Valença.
Após as análises, Valença verificou que o que leva as pessoas com transtornos mentais a cometer homicídio e ações de violência está relacionado com a falsa sensação – causada pelas alucinações e delírios -, de que as pacientes estão sendo ameaçadas ou colocadas em perigo pelas pessoas mais próximas, o que na verdade não existe.
“A maioria das agressões aconteceu entre membros familiares. Acredito que isso acontece pela facilidade de contato. Os familiares estão mais presentes na convivência doméstica e no dia-a-dia, por isso mais suscetíveis às ocorrências”, relaciona.
No entanto, Valença explica que esse estudo não deve ser motivo para preconceito com os doentes. “Pelo contrário, quero entender os fatores que contribuem para a doença e propor medidas de intervenção terapêuticas para os pacientes em risco, assim podemos minimizar comportamentos violentos e, consequentemente, diminuir os riscos para a sociedade”, esclarece.
Divulgação |
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Ver o que não existe ou escutar vozes. Pacientes com transtornos psicóticos precisam de tratamento e acompanhamento direto. |
Sintomas dos pacientes
Átila Alberti |
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O paciente ouve vozes de pessoas que não estão presentes no ambiente, vê pessoas ou vultos sem que eles estejam presentes, pensa ainda que as outras pessoas não o reconhecem no ambiente. Marco Antonio Bessa, presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria. |
Delírios e alucinações são os principais sintomas d,os pacientes com transtornos psicóticos. De acordo com o presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, Marco Antonio Bessa, alucinações representam alterações na sensopercepção como, por exemplo, alucinações visuais, auditivas ou olfativas.
“O paciente ouve vozes de pessoas que não estão presentes no ambiente, vê pessoas ou vultos sem que eles estejam presentes, sente odores, pensa ainda que as outras pessoas não o reconhecem no ambiente. Já os delírios acontecem quando o paciente passa a acreditar em coisas que não existem”, explica.
Segundo Bessa, vários motivos podem fazer com que uma pessoa sofra com os transtornos psicóticos como, por exemplo, fatores genéticos, uso de drogas, doenças como Alzheimer, tumores cerebrais, dentre outros.
A esquizofrenia é o principal dos transtornos psicóticos. Além dela existem o transtorno psicótico breve, transtorno esquizofreniforme, esquizoafetivo, delirante e transtorno psicótico induzido por substâncias ou por uma condição médica geral. No entanto, dependendo do diagnóstico do paciente, os transtornos podem ser curados.
“O tratamento pode acontecer com medicamentos antipsicóticos (para controlar as alucinações e delírios), antidepressivos e estabilizadores do humor. Além dos medicamentos, terapia individual, de grupo e familiar também podem ser úteis, dependendo de cada caso”, explica.
Crimes normais e anormais
Na psiquiatria, os crimes são classificados em duas categorias: normal e anormal. De acordo com o psiquiatra da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) Alexandre Martins Valença, a diferença entre os dois modos varia de acordo com a situação de cada país.
“O normal acontece quando a pessoa o comete sem ter nenhuma doença mental. Nesses casos, os índices de homicídio são maiores em países cuja taxa de violência é alta, como no Brasil. Essa característica traduz a desigualdade social, a violência”, explica. Já a definição anormal, Valença afirma que é relacionado aos crimes cometidos pelos indivíduos com doenças mentais.
“Pelas características do crime e pelo exame patológico do assassino, é possível perceber que foi cometido por um doente mental. Essa característica é mais comum em países altamente desenvolvidos, onde as taxas de violência e de criminalidade são mais controladas”, conta.