Com a chegada em Marte da sonda Phoenix, em maio de 2008, as evidências sobre a existência de água na superfície marciana foram confirmadas de modo inquestionável, segundo a Nasa.
Com efeito, a sonda européia Mars Express, em 2003, já havia detectado indícios e confirmou hipóteses baseadas em medidas realizadas pelo orbitador americano Mars Odyssey que, desde 2001, fornece dados que conduziram à conclusão de que a calota polar austral de Marte é constituída de água em estado sólido.
Esta ilação já havia sido obtida de modo indireto e especulativo. Ao contrário, observações diretas do pólo sul não deixam dúvidas de que as vastas banquisas das calotas polares de Marte são em sua maior parte constituídas de gelo seco (dióxido de carbono) e de gelo, sendo que este último se apresenta em concentrações de 80% para determinadas regiões. Acredita-se que a presença de água suja, em estado sólido, junto ao gelo seco, sugere que a calota polar está em regressão.
Se este fato for confirmado por outros métodos, uma tal “regressão” do dióxido de carbono por sublimação (passagem do estado sólido para o estado gasoso) significa que o planeta vermelho não está inativo, mas atravessando um estado transitório de sua história.
Na realidade, o pólo sul de Marte, assim como a água provavelmente existente no subsolo, é, com efeito, geralmente considerado pelos astrônomos defensores da terraformação (teoria segundo a qual seria possível tornar qualquer planeta – onde as condições fossem favoráveis – habitável), semelhantes ao que ocorreu com a Terra, que passou por tal evolução.
Aliás, como esta zona do planeta se encontra constantemente numa temperatura de 130ºC abaixo de zero, condição segundo a qual o dióxido de carbono permanece em equilíbrio entre os estados sólido e gasoso, uma pequena variação de temperatura no pólo sul pode conduzir a passagem, para a atmosfera marciana, de uma grande quantidade de gás carbônico.
Tal alteração levará, por exemplo, a um aumento de densidade da atmosfera do planeta que irá favorecer uma subida de temperatura em conseqüência do efeito estufa.
Deste modo, o permafrost (congelamento permanente no subsolo numa profundidade da ordem de 50 cm a um metro), constitui “um reservatório de uma futura atmosfera”.
O Mars Express liberou mais informações sobre a atmosfera marciana. A sonda européia transmitiu os primeiros registros sobre a existência de dois gases: o oxigênio e a água em estado gasoso.
No entanto, em fraca quantidade na atmosfera marciana, que é essencialmente composta de dióxido de carbono. A ausência de água em estado líquido reduz a esperança de encontrar forma de vida marciana suspensa nesse estado.
Água líquida
Uma grande revolução ocorreu quando, em 2 de março de 2004, o robô da agência espacial norte-americana Nasa, o Opportunity, encontrou indícios de que já existiu água líquida entre as rochas da região chamada Meridiani Planum, onde o robô pousou.
Parece que diversas regiões da superfície de Marte já foram cobertas por água e tiveram ambientes propícios à existência de vida, como supunha uma grande parte dos astrônomos. No entanto, esta é a primeira vez que a Nasa confirmou a existência de água líquida no passado de Marte a partir de análises feitas na superfície do planeta.
A análise das rochas identificou a presença de sulfatos e traços físicos como a erosão e formação de nichos de cristais. A ação da água mudou a textura e a composição química superfície. Além do mais, as análises do robô conseguiram traduzir as pistas deixadas na rocha e, em conseqüência, a Nasa está mais confiante nessa conclusão da missão Mars Exploration Rover.
Tudo parece sugerir que a região de Meridiani Planum é um dos lugares que teria permitido a existência de vida, mas ainda não há uma confirmaç&atil,de;o em relação a esta última conclusão.
O Opportunity, assim como o robô gêmeo Spirit, que pousou em Marte em janeiro de 2003. Os dois examinam o solo e as rochas para descobrir a possível existência de vida no planeta, numa missão que deve durar no mínimo três meses.
Na realidade, a maior parte dos exobiólogos acredita que as condições atmosféricas reinantes em Marte podem ter levado a água a se refugiar nas profundidades do solo, ou seja, a cerca de 100 metros abaixo da superfície da região equatorial, onde a temperatura é mais elevada do que na superfície, em conseqüência do efeito geotérmico comum aos planetas semelhantes à Terra, como é o caso de Marte.
Vida bacteriana
Se viermos a encontrar vida em Marte, ela deve existir sob a forma de bactérias que, tendo surgido nas épocas passadas, quando as condições em Marte eram mais favoráveis, sobreviveram ao clima mais rigoroso, adaptando-se.
Se alguma forma de água acessível no planeta se confirmar, além de implicar a possibilidade de vida, toda ela será de grande importância para os futuros colonizadores do planeta.
Com efeito, se por um lado a água marciana, depois de purificada, poderá ser tão útil para beber quanto a água terrestre, por outro lado, como a água é constituída de hidrogênio e oxigênio, será possível aos futuros exploradores do planeta extrair o hidrogênio necessário à propulsão dos seus motores de combustível líquido.
De fato, uma vez instalada, tal destilaria teria a capacidade de decompor água, usando para isto a energia solar; seria também fácil para o combustível necessário ao reabastecimento dos tanques das espaçonaves logo que elas chegassem ao planeta.
Ademais, o oxigênio assim produzido pela decomposição de água poderia ser usado para reabastecer a atmosfera respirável das primeiras instalações dos colonizadores.
Se for possível gerar combustível, ar e água na própria superfície marciana, também será possível cultivar alimento. Aliás, o tipo de solo vulcânico existente em Marte é muito favorável à agricultura, como se verificou em relação às regiões atingidas por lavas vulcânicas na superfície terrestre.
As primeiras experiências e os primeiros depósitos de combustível e de água poderiam ser realizados por sondas robôs que iriam preparar as condições para a chegada das primeiras missões tripuladas. Alguns espaço-engenheiros acreditam que os robôs poderiam construir as primeiras estufas, para cultivo de alguns alimentos.
Os benefícios tecnológicos das missões a Marte, inicialmente com robôs e, em seguida, com as viagens tripuladas causarão mudanças mais profundas na vida da humanidade do que aquela provocada pela missão Apollo, que conduziu os primeiros homens à superfície lunar.
O ser humano terá que se adaptar às novas condições de vida no espaço, criando instrumentos jamais sonhados pela nossa mente como ocorreu com o homem pré-histórico, que ao elaborar os seus primeiros objetos de pedra lascada nem imaginaria a parafernália eletrônica que hoje nos cerca.
Sem dúvida, os avanços maiores serão na qualidade de vida, em especial, na medicina, tendo em vista as condições que o frágil organismo humano será obrigado a suportar.
Se a descoberta de água em Marte é muito importante para os futuros colonizadores do planeta vermelho, para nós, terráqueos, será de enorme importância para o futuro da vida em nosso planeta conhecer como as atmosferas dos nossos vizinhos no espaço interplanetário evoluíram ao longo do tempo.
Ronaldo Rogério de FreitasMourão é astrônomo e autor de mais 85 livros, entre outros, Quem é vivo sempre aparece: um pequeno ensaio sobre a procura dos Ets.
Mars Express
A sonda da ESA (Agência Espacial Européia) foi lançada em 2 de junho de 2003.
A missão consistia no orbitador Mars Express e no robô Beagle 2, que após pousar em Marte deixou de transmitir sinais.
Por outro lado, em janeiro de 2004, a Mars Express detectou água em forma de gelo no pólo sul do planeta, confirmando dados da sonda americana Mars Odyssey, que descobriu água congelada em marte em 2001.
Opportunity
Projetado para funcionar por 90 dias, a sonda robô impressionou por sua
robustez e precisão, operando normalmente por mais de 4 anos, juntamente com seu irmão gêmeo, a sonda Spirit.
Logo na “aterrissagem” no planeta vermelho, o Opportunity descobriu evidências de água em Marte. A Nasa aguarda o fim do inverno no planeta para tentar retomar as missões com os dois robôs.
Sonda Phoenix
Lançada de Cabo Canaveral em 4 de agosto de 2007, tem o objetivo de pesquisar por moléculas de água na região do pólo norte de Marte, onde pousou em 25 de maio de 2008.
Em 31 de julho desse ano, a Phoenix confirma a existência de gelo no planeta. Para os técnicos, é a primeira vez que a existência de água é provada quimicamente. Em 4 de agosto, a Phoenix descobriu água em estado líquido em Marte.