A heterogênea química dos adoçantes

Quatro sensações de sabor são mais facilmente perceptíveis às papilas salivares: doce, salgado, ácido e amargo, sendo que o doce tem duas matizes: passageiro ou persistente, o segundo caso sendo o do alcaçuz da tradicional pastilhinha nipônica Jintan. Historicamente, o mel deve ter sido a primeira matéria natural doce a impressionar o homem, pois trata-se da ocorrência mais concentrada existente na natureza de glucose (31%) e frutose (38%) livres, que são os monossacarídeos constituintes da sacarose ou açúcar de mesa, mais comumente obtido da cristalização dos caldos de cana e de beterraba branca, onde ocorre na concentração de 16 a 20%.

Carboidratos simples, como a glucose e sacarose, conduzem metabolicamente, se ingeridas em excesso, a um acúmulo de um metabólito intermediário, o Acetil-CoA, que é precursor das gorduras, triglicerídios ou triacilgliceróis, ou seja, os agentes materiais da obesidade.

formula1190807.jpgO surgimento da estratégica combinação de pares de aminoácidos como o ácido aspártico com a fenilalanina (aspartame, neotame) ou com a D-alanina (alitame) levou à descoberta (inicialmente acidental) de edulcorantes, ou adoçantes, entre 180 e 8 mil vezes (!) mais doces do que a própria sacarose. Significa que para o mesmo propósito de adoçar uma jarra de limonada dispensa-se duas colheres de sopa de açúcar de mesa em favor de uma cabeça de alfinete de edulcorante artificial como o neotame. Persiste, todavia, no mercado nacional a preferência pela sacarina seja por si ou em combinação com outros edulcorantes sintéticos, como o ciclamato. De fato, a descoberta do aspartame em 1965 pelo químico Jim Schlatter foi realmente acidental, já que o mesmo ensaiava o dipeptidio aspartil-fenilalanina na busca de um remédio para úlceras gástricas e ao acaso acabou levando à boca um dedo que tocara num guardanapo molhado com a solução em teste.

formula2190807.jpgÉ difícil imaginar como uma família de receptores bucais possa reconhecer e deixar expressar a sensação de doce frente a tão heterogêneos estímulos químicos. Se por um lado as hidroxilas da glucose e frutose presentes na molécula de sacarose não se distinguem dos substituintes clorados da sucralose ou o fato de o grupamento dióxido de enxofre ser o dominante no reconhecimento da sacarina e ou ciclamato (ver figuras), por outro lado os demais grupamentos químicos presentes nos outros grupos de adoçantes naturais (ex: glicoproteínas de arbustos africanos como a monelina) ou glicosídeos diterpênicos do esteviosídio e do rebaudiosídio e ainda os antes referidos aminoácidos estratégicos para o dulçor se constituem em verdadeira panacéia química frente aos receptores da sensação desejada.

José Domingos Fontana (jfontana@ufpr.br) é professor emérito da UFPR, pesquisador 1A do CNPq (1996-2006) e prêmio paranaense de C &T (1996).

Diabéticos são principais beneficiados

Mais do que a marcada demanda dos obesos em geral, uma clientela especial é a grande beneficiária da indústria químico-farmacêutica dos neo-edulcorantes: os diabéticos. Até mesmo a frutose (70% mais doce do que a sacarose e glucose) cumpre parte neste papel dietético, pois é tida como um carboidrato não insulinogênico, ou seja, não estimula a secreção de parcelas adicionais do hormônio. Já no caso do xilitol, embora sua edulcorância seja equivalente à da sacarose, há a vantagem de não ser cariogênico, além de que, por conta do calor de dissolução, cria na boca a agradável sensação de frescor. Além do xilitol, que é derivado da hemicelulose de madeira, seguido de uma hidrogenação pós-hidrólise, outros polióis tem seu lugar assegurado na família dos edulcorantes semi-naturais: maltitol, sorbitol e lactitol, pois trata-se de derivados da hidrogenação de fontes naturais relativamente simples, como a hidrólise de amido (glucose e maltose) e leite de vaca (lactose).

O mercado global de edulcorantes se situa em US$ 3,6 bilhões por ano, sendo que Estados Unidos e Europa respondem por 65% do consumo. De acordo com a empresa de consultoria em mercados Mintel, entre 2000 e 2005 foram lançados 3.290 novos produtos contendo edulcorantes artificiais para os consumidores norte-americanos, sendo que 1.649 destes produtos apenas no ano de 2004. Isto siginifica um crescimento de mercado anual na ordem dos 8% por ano.

Nos Estados Unidos, em 2005, o aspartame, isoladamente, correspondeu a 48% de toda a venda de adoçantes de dulçor intenso, cifra que deverá ser atingida, em 2012, pela sucralose. Tão somente a Ajinomoto (Japão) produziu 18 mil toneladas de aspartame em 2006. Tendo-se em conta que o Brasil colherá, na safra-ano 2007/2008, mais do que 500 milhões de toneladas de cana-de-açúcar cujo caldo contem ca. 20% de sacarose, estas 100 milhões de toneladas de sacarose, se integralmente direcionadas para a síntese química de sucralose (?Splenda?), nos converteriam em fornecedor exclusivo de edulcorante artificial para todo o mundo por, no mínimo, de algumas décadas! (JDF)

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