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Ben Shneiderman: Leonardo  da Vinci é inspiração por causa do seu estilo de vida.

?A informática de hoje versa sobre aquilo que os computadores podem fazer, a nova informática versará sobre aquilo que as pessoas podem fazer?. A frase que abre o prefácio do livro O laptop de Leonardo como o novo renascimento já está mudando a sua vida, lançado no Brasil pela editora Nova Fronteira, resume bem o pensamento de seu autor, o norte-americano Ben Shneiderman. Considerado um dos maiores especialistas em ciência da computação dos Estados Unidos, ele acredita que o século XXI pode testemunhar um novo renascimento, o ?Renascimento 2.0?, caso saiba reconhecer as necessidades dos seres humanos no aprimoramento da tecnologia.

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?Na nossa era de especialistas, as combinações de habilidades múltiplas nos surpreendem, mas era isso que tornava Leonardo tão fantástico e criativo?, afirmou o especialista em uma entrevista por e-mail ao O Estado. Professor de Ciência da Computação da Universidade de Maryland, onde dirige o Laboratório de Interação Humana-Computador, Shneiderman é considerado nos Estados Unidos um guru da área, defendendo pontos de vista no mínimo polêmicos. Além de acreditar que a tecnologia só faz sentido quando melhora a qualidade de vida das pessoas, Shneiderman defende, entre outras coisas, penalidades para companhias que fizerem programas que travem. ?Cada vez que uma aplicação travar seu computador, você recebe US$ 1 em forma de crédito do desenvolvedor. Assim eles ganham dados sobre as falhas e você recebe uma pequena compensação?.

O Estado – Por que Leonardo da Vinci? Como seu estilo de vida pode ser o ponto inicial para um livro do século XXI que fala sobre computadores e internet?

Ben Shneiderman – Leonardo é uma grande inspiração por causa de seu estilo de vida, que integra arte e ciência, engenharia e estética, pensamento visionário e valores humanos. O que precisamos é o que chamo de ?Renascimento 2.0?. Muitos usuários de sistemas de computador hoje sofrem e experimentam frustrações na tentativa de usarem suas máquinas. Acho que todo o designer, assim como Leonardo, gostaria de antever um futuro elegante, confortável, satisfatório, compreensível e controlável. Esses são adjetivos que gostaríamos de acrescentar às interfaces e sistemas que usamos. O livro conclama a uma nova renascença e um pensamento renovado sobre as necessidades dos usuários, elevando a expectativa deles e a responsabilidade dos designers. Por isso acho que Leonardo da Vinci é a musa apropriada para a nova computação, por ter o tipo de unidade que precisamos.

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O Estado – Quanto de seu livro sai de frustrações pessoais com o cenário atual dos computadores?

Ben – O livro realmente é baseado no que sinto em relação à tecnologia. E posso dizer que minha frustração pessoal continua em alta com a tecnologia em geral. Uma recente pesquisa nossa mostra que 40% a 46% do tempo dos usuários é jogado fora, utilizado em tentar fazer o computador funcionar… nós podemos fazer muito melhor do que isso! O estudo sugere que as pessoas perdem 5,1 horas por semana tentando fazer seus computadores funcionarem.

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O Estado – Quem você culpa pelos maiores problemas associados com o velho estilo da computação?

Ben – Com certeza as grandes companhias de softwares devem aceitar parte da culpa, mas os usuários devem aceitar alguma responsabilidade. Eles deveriam reclamar mais e aumentar suas expectativas. Precisam aprender o que é possível e forçar os desenvolvedores a fazer melhores produtos. Espero engajar o pessoal da tecnologia a pensar mais nos usuários e a realizar um rigoroso estudo sobre o comportamento de quem usa tecnologia. A meta não é fazer máquinas que se comportam como pessoas, mas sim criar ferramentas muito mais poderosas que habilitem novatos a terem performance de experts, que por sua vez poderão ter resultados mil vezes melhores dos que alguém já tenha tido até hoje. Mas a tecnologia tem trazido consigo problemas, por isso temos que estar atentos aos perigos de maximizar seus benefícios.

O Estado – O Brasil tem uma característica curiosa: é um país não desenvolvido com um grande número de usuários de internet e de telefones celulares. Uma tecnologia baseada em pessoas pode ajudar os usuários incluídos nessa equação?

Ben – Estive quatro vezes no Brasil a apreciei muito a vivência socializante que percebi por aí. Na minha opinião o País precisa capitalizar seus ativos humanos e desenhar a tecnologia para servir às suas necessidades, o que incluem saídas de baixo custo para promover usabilidade universal.

O Estado – Quais áreas deverão ser as mais beneficiadas pelas inovações apontadas em seu livro?

Ben – As quatro principais aplicações que terão as melhores oportunidades de melhorar a qualidade de vida dos usuários são o e-commerce (comércio eletrônico), e-learning (educação eletrônica), e-government (governo eletrônico) e o e-healthcare (saúde eletrônica) que o livro descreve como World Wide Med (trocadilho que o autor faz entre um possível sistema de saúde generalizado com a World Wide Web). Em cada um dos capítulos falo em como Leonardo tratou desses assuntos em seu tempo. Então interpreto essa mensagem de maneira que nós possamos usar e criar experiências mais satisfatórias nos dias atuais. Com o World Wide Med, por exemplo, a idéia é ter toda a informação médica que estiver disponível, inclusive do paciente, nos lugares de atendimento, melhorando, além do tratamento, a prevenção, uma idéia renegada pela tecnologia atual.

O Estado – Você certamente não tem dificuldade de convencer as pessoas de que elas gastam muito tempo e que isso as deixa frustradas. Mas há maneira de convencê-las de que algo pode ser feito sobre isso?

Ben – Concordo que é difícil. Mas mudar as mentes dos desenvolvedores de software e construtores é muito mais difícil, mesmo assim eu vejo sucessos todos os dias em produtos melhorados, discussões públicas de interfaces de usuários e na educação de estudantes e profissionais. Mudanças grandes precisam de tempo, mas elas estão acontecendo. Um meio é criar motivações e penalidades para os desenvolvedores: uma proposta é que cada vez que uma aplicação travar seu computador, seja gerado um relatório eletrônico e você receba US$ 1 em forma de crédito do desenvolvedor. Eles ganham dados sobre as falhas e você recebe uma pequena compensação/recompensa.