Réplica da caravela Santa Maria, comandada por Colombo.

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No último dia 20 de maio se completaram 500 anos da morte de Cristóvão Colombo. A vida e a morte do Almirante do Mar Oceano está cercada de mistérios. Alguns pesquisadores questionam até mesmo a sua origem italiana, sugerindo que tenha nascido na Espanha ou em Portugal, no entanto a história oficial considera-o como nascido na Itália, em Gênova, provavelmente em 31 de outubro de 1446.

Seu avô, Giovanni Colombo, viveu no vilarejo de Quinto al Mare, situado no litoral, a sete quilômetros a leste de Gênova e próximo de Nervi. Teve dois filhos: Antonino e Domenico, que se estabeleceram em Gênova. Domenico, tecelão em Quinto al Mare, casou-se com Suzanna Fontanabuona, de Bisagno, subúrbio de Gênova, com quem teve quatro filhos: Cristoforo, Giovanni-Pellegrino, Bartolomeo, Giacomo ou Diego, e uma filha, Bianchinetta.

Cristoforo Colombo fez seus estudos em cosmografia, astrologia e geometria na Universidade de Pavia. Recebeu na juventude uma educação muito elementar. De fato, os tecelões tinham no bairro de Saint-Etienné escolas primárias, onde se aprendia a leitura, a escrita e um pouco de geografia. Mais tarde, em Portugal e, durante as suas viagens, instruiu-se por seus próprios esforços. Até a sua maioridade, aos 25 anos, ocupou-se com a atividade de tecelão, tendo figurado ao lado do seu pai nos contratos de compra de lã. Como vivia em uma cidade marítima, é muito provável que tenha começado a navegar desde a adolescência, durante as estações mortas, quando a atividade da sua profissão era menos lucrativa, como escreveu no seu diário de bordo, em 21 de dezembro de 1492, ao afirmar ter navegado, sem interrupção, desde os 23 anos. No entanto, não há dúvida que adotou a profissão de marinheiro por ocasião de sua maioridade.

Navegador com mérito universalmente reconhecido, só possuía conhecimentos científicos médios. Com referência à geometria, era menos instruído que os matemáticos contemporâneos. Suas observações relativas à variação da declinação da agulha de marear foram muito apreciadas, em virtude de seu cuidado, atenção e engenhosidade. Observou, sempre que possível, os eclipses que os almanaques previam. Convém salientar que a sua cultura não era a de um italiano, mas a de um espanhol. Com efeito, quase todas as suas cartas foram redigidas em espanhol, até mesmo as enviadas ao papa e aos seus familiares e amigos italianos.

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A partir de 7 de agosto de 1473, não se encontram sinais de sua presença na Itália. Pouco se conhece de suas primeiras viagens. Entrou em Portugal, no fim de 1473 ou início de 1474, onde fixou residência e se casou. Em 1477, passou pela Inglaterra. Atraiu seu irmão caçula Bartolomeu para Lisboa, onde já era reconhecido como cartógrafo e calígrafo muito hábil. Todavia, desde cedo, seu interesse esteve sempre voltado para a navegação. No Mediterrâneo, navegou até a ilha de Quios; na Inglaterra chegou, em 1477, a cem milhas no mar em direção a Thule (ilhas Feroe) e, na costa da Guiné, visitou o Forte de São Jorge da Mina, entre 1482 e 1484. Esteve em Porto Santo, próximo à ilha da Madeira, onde conheceu sua esposa Philippa Moniz, de família oriunda do Alentejo. Acredita-se que sua esposa descendia do primeiro colono de Porto Santo, Bartolomeu Perestrelo. Seu casamento deu-se em Lisboa, em 1479 ou 1480. No período de 1484 e 1486, quando deixou Portugal, abandonou a esposa e filhos.

Sua atitude seria ainda mais censurável, se for verdadeira a informação de que ao acompanhar sua esposa a Porto Santo, teria recebido dos parentes desta as indicações que lhe permitiram conceber o projeto de cruzar o Atlântico e atingir a Ásia pelo Ocidente. Em contato com os navegantes portugueses que fizeram o reconhecimento da costa ocidental africana, ouviu relatos e notícias confusas (misturadas com lendas) de terras no lado oeste do Atlântico.

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Além das lendas medievais sobre ilhas no Atlântico e dos relatos de crédito duvidoso, a mente de Colombo foi influenciada pela notícia de Marco Polo sobre o Extremo Oriente e pelas noções geográficas de Toscanelli, que estimava uma dimensão menor para a Terra e, assim como sugeria, o Oriente estaria mais próximo dos europeus se atravessassem o Atlântico em direção ao Ocidente. Na realidade, a viagem, que resultou na descoberta da América, não foi conseqüência de um acidente nem de uma expedição improvisada. Foi o resultado de um plano longamente estudado, cuja execução exigiu dedicação, energia inesgotável e indomável força de vontade de Colombo, sem dúvida os seus maiores méritos. Não se pode atribuir este projeto à sua genial intuição, nem à sua imaginação pessoal. Ao contrário, a idéia já estava no ar. Vários dos seus contemporâneos já tinham expressado, em teoria, a maior parte destas idéias, radicalmente errôneas, reforçou a convicção do grande navegador. Elas não eram exclusivamente suas. As principais parecem ter sido retiradas de uma das obras mais difundidas na época: Tratatus de imagine mundi (c.1410), de Pierre d’Ailly (1350-1420), cardeal de Cambray. Foi deste livro que Colombo extraiu quase todo seu conhecimento cosmográfico e geográfico e, principalmente, as idéias gerais relativas às dimensões e à forma da Terra, à largura do Oceano e à situação do paraíso terrestre. Aliás, a passagem mais importante desta obra refere-se à concepção do mundo habitado, inspirada, sem dúvida, na obra Opus magnus, de Roger Bacon. Para d’Ailly, os argumentos de Averróis de que a distância entre a costa ocidental da África e a costa oriental da Índia não podiam estar muito afastadas pois os dois países possuíam elefantes. Foram estas e outras idéias semelhantes, expostas pelas mais importantes autoridades do século XV, que inspiraram a convicção de estar absolutamente certo, fornecendo-lhe os argumentos, aparentemente excelentes, com os quais foi possível demonstrar junto às autoridades que o empreendimento de uma viagem às Índias pelo oeste era fácil e relativamente pouco dispendioso.

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão é astrônomo, criador e primeiro diretor do Museu de Astronomia e Ciências Afins. Escreveu mais de 75 livros, entre outros, “Anuário de Astronomia e Astronáutica 2006”. Consulte a homepage: http://www.ronaldomourao.com

30 de abril de 1492: expedição armada

Na primavera de 1491, Medina Celi solicitou à rainha a ordem de expedir três caravelas ao mar ocidental sob as ordens de Colombo. A rainha recusou a autorização, confiando o exame do projeto a Alonso de Quintanilla, em Sevilha. Os preparativos da tomada de Granada fizeram com que a solicitação fosse esquecida. Decidido a deixar a Espanha com destino à França, Colombo foi a Córdoba, onde procurou o filho Diego para confiá-lo a seu cunhado Muliar, enquanto deixava o outro filho, Fernando, sob a guarda da mãe, Beatriz Enriquez.

Em condições miseráveis, foi a Huelva, ao Monastério de la Robida, pedindo ao porteiro pão e água para o seu pequeno Diego. Um monge de nome Juan Perez, tocado pelo seu sotaque estrangeiro, perguntou-lhe quem era e de onde vinha. Após informar que era um navegante que vinha da corte, onde tinha solicitado apoio para o seu projeto de descoberta marítima, relatou que as pessoas da corte real troçaram das suas idéias, deixando-o desesperado. Em Huelva, desejava procurar o seu cunhado. O monge mandou procurar o médico Garcia Hernandez de Palos, que conhecia um pouco de cosmografia. Entusiasmado pelo plano, o padre Juan Perez, antigo confessor da rainha Isabel, resolveu enviar uma carta à rainha. Transmitida por um piloto de Lepe, Sebastião Rodriguez, a resposta chegou ao fim de 14 dias, solicitando a presença de padre Juan Perez na corte. Este, após conferenciar com a rainha, a quem expôs sua confiança no projeto de Colombo, regressou a Robida para procurar Colombo, levando-o consigo ao campo de Santa Fé em dezembro de 1491. Uma nova conferência se realizou, onde o cardeal Mendoza teve um papel fundamental. Primeira autoridade eclesiástica da Espanha, D. Pedro Gonzalez de Mendoza, bispo de Toledo, ao se declarar a favor de Colombo, decidiu o resultado da reunião: o projeto de Colombo foi aceito. O cardeal Talavera, que presidiu a reunião de Salamanca, foi desta vez favorável, manifestando um zelo todo especial. Ainda neste mês de Janeiro de 1492, os reis católicos, que acabavam de conquistar o reino de Granada, decidiram apoiar uma expedição que deu à Espanha um domínio várias vezes superior. A convenção definitiva ocorreu em 17 de abril de 1492, durante a qual as suas pretensões foram aceitas, dentre elas enobrecê-lo e à sua família, assim como deveria receber o título de almirante, transmissível aos seus descendentes. Exigiu Colombo que nas terras que viesse a descobrir seria o vice-rei, com o poder de propor para os altos empregos três candidatos para cada província. Exigiu também que o décimo dos lucros reais em pérolas, pedras preciosas, ouro, prata, especiarias e outras mercadorias lhe fosse reservado. Pelo acordo assinado, seria o único juiz em todos os processos relativos ao comércio destas terras na Espanha. No caso em que viesse a fornecer um oitavo das despesas da expedição, receberia, em contrapartida, um oitavo do benefício total.

Em 30 de abril de 1492, foi dada a ordem de armar a expedição no porto de Palos, na Andaluzia. Na sexta-feira, 3 de agosto de 1492, às oito horas da manhã, três caravelas -Santa Maria, tripulada por 65 homens e comandada pelo próprio Colombo; Pinta, com trinta tripulantes, comandada por Martin Alonso Pinzón e Niña, com 25 homens sob o comando de Vicente Yañez Pinzón – ultrapassaram a barra de Saltes, na embocadura de Odiel e do rio Tinto, em frente a Huelva. Após uma parada nas Canárias, a pequena armada deixou a ilha Gomeira, em 6 de Setembro, penetrando pelo oceano Atlântico rumo ao oeste. Em 12 de outubro, às duas horas da manhã, o marinheiro Rodrigo da Triana, de caravela Pinta, viu, ao luar, uma praia. Uma salva assinalou a descoberta da terra para os outros navios.

Depois de uma exploração de quase quatro meses, ao longo das costas do Haiti e de Cuba, em 4 de Janeiro de 1493, Colombo retomou seu caminho de volta. Em seu regresso passou por Lisboa. Ao tomar conhecimento da descoberta, D. João II reclamou, imediatamente, a posse desses territórios, criando uma crise diplomática com os espanhóis que só seria resolvida em 1494, com o Tratado de Tordesilhas. Em 14 de março desembarcou em Palos. Realizou em seguida mais três outras viagens: a segunda entre 1493 e 1496, a terceira entre 1498 e 1500 e a quarta entre 1502 e 1504.

Seus últimos anos de vida foram muito tristes. Não foi possível concluir todos os seus planos. Profundamente ferido em seu legítimo orgulho e mesmo em sua honra, morreu convencido que estivera no Extremo Oriente, sem imaginar que havia descoberto um novo continente. O falecimento de Colombo deu-se em Valladolid, a 20 de maio de 1506, um ano e meio após a morte da rainha Isabel, sua protetora, em 26 de novembro de 1504. (RRFM)

Erros cosmográficos e teorias místicas

Como ironia do destino, a maior descoberta marítima do milênio resultou de enormes erros cosmográficos associados às teorias filosóficas e místicas que dominaram a época. De fato, o entusiasmo de Colombo aumentou com a esperança de encontrar, na costa oriental da Índia, o paraíso terrestre que Isodoro de Sevilha, João Damasceno, o venerável Beda e d’Ailly colocavam junto às encostas de uma imensa montanha. Aceitava-se também a idéia que o fim do mundo iria acontecer dentro de um prazo de 150 a trezentos anos, o que tornava indispensável o regresso a esse paraíso terrestre. Além destes fatos, existiam vários indícios que sugeriam a existência de terras no Ocidente. Apesar de todas estas indicações, os portugueses faziam grandes esforços para encontrar um caminho para as Índias pelo leste, contornando a África. Ao contrário dos navegantes portugueses que solicitavam meios para a exploração agrícola das ilhas no Atlântico que se acreditavam existir, Colombo visava atingir as Índias seguro de que o sucesso do seu projeto mudaria as condições econômicas de sua época. Só a partir de 1474 os portugueses começaram a questionar a possibilidade de atingir a Índia pelo oeste (Ocidente), mas sem grande entusiasmo, pois estavam absorvidos em suas tentativas de contornar a África.

Outro elemento fundamental é a carta de Paulo Toscanelli (1397-1482) a Colombo, de data anterior a 1482 (lamentavelmente perdida), da qual se conhece o seguinte texto graças a uma cópia à mão, de Colombo:

“Já falei de uma rota marítima para atingir os países das especiarias, mais curta do que aquela no largo da costa da Guiné. É por isso que o rei me solicitou hoje explicações sobre o assunto, suficientemente claras para que os homens mesmo mediocremente instruídos possam compreender a existência desta rota. Embora saiba que isso pode ser mostrado com a ajuda de uma esfera representando a Terra, estou entretanto decidido, a fim de me fazer mais facilmente compreendido e com menos trabalho, representar esta rota sobre uma carta náutica. Envio, portanto, a Vossa Majestade um mapa de minha mão sobre o qual estão traçadas as costas e as ilhas, a partir das quais é necessário se dirigir constantemente para o Ocidente, os lugares onde se deve abordar, a que distância é necessário se manter do pólo e do equador, e a distância a vencer para chegar a esses locais, os mais ricos em especiarias e em pedras preciosas. Não se admire se chamamos de ocidental esta região das especiarias, bem que o uso seja o de chamá-la oriental; é que dirigindo-se para o oeste, na região inferior (subterrânea) da Terra se chegará lá, embora se tenha sempre procurado a rota na direção oriental e superior…”.

A carta de Toscanelli estimava que a distância pelo Ocidente entre Lisboa e a grande cidade de Quinsay era de 26 graus de 250 milhas cada uma, ou seja, um terço do perímetro do globo; mas entre a ilha de Cipango e a das Antilhas, o espaço realmente desconhecido se reduz em 10 graus. A Colombo, Toscanelli escreveu: “Aceito o seu projecto de navegação para Oeste e estou convencido de que a rota que você quer seguir não é tão difícil como se acredita; pelo contrário, tal como tracei, é totalmente segura”.

Todos estes dados, assim como o prestígio da ciência, o interesse da religião, a esperança de fortuna, de um fim do mundo e a procura do paraíso, encorajaram Colombo a ultrapassar todos os obstáculos e dificuldades para tornar realidade o seu plano.

De início, tentou o apoio do rei de Portugal, D. João II, o Príncipe Perfeito, que não aceitou seu projeto. Tentou através do seu irmão, Bartolomeu, sensibilizar os soberanos da França e da Inglaterra. Nenhuma dessas cortes se interessou pelo projeto.

Entre o outono de 1484 e o mês de janeiro de 1486, Colombo se transferiu para a Espanha. No inverno de 1486 e 1487, foi para Córdoba e Salamanca. Nesta época tomou como amante Beatriz Enriquez. Em conseqüência desse novo amor, permaneceu o inverno de 1487-88 em Córdoba, onde em 15 de agosto de 1488 nasceu seu filho Fernando. Nesse intervalo de tempo, solicitou do rei João II de Portugal seu regresso a Lisboa; a autorização foi obtida em carta de 20 de março de 1488. Em 16 de junho, recebeu um novo auxílio dos reis da Espanha que, em maio de 1489, ordenaram que voltasse a Córdoba.

Uma conferência ocorrida em Salamanca examinou o plano de Colombo; a maioria declarou que seu projeto era inexecutável. Não perdeu a esperança. Como a guerra contra os mouros e as inundações absorveram, durante dois anos, a atenção dos soberanos espanhóis, Colombo pensou em deixar a Espanha. Um grande senhor, Luís de la Cerda, duque de Medina Celi, tomou-o sob proteção, e finalmente decidiu financiar o plano de Colombo. (RRFM)