A adolescente Pâmela Nogueira dos Santos, de apenas 17 anos, é mãe de Ágatha, de dois anos e, aos oito meses e meio de gravidez, já se prepara para a chegada de sua segunda filha. Ela conta que vivia com seus avós, em Colombo, e que, antes de Ágatha nascer, casou e foi morar com seu marido, um jovem de 21 anos. “Eu trabalhava como atendente de lanchonete e fazia curso de auxiliar administrativa, mas saí do curso e do emprego assim que engravidei. Ainda pretendo estudar, gostaria de fazer faculdade. Mas, antes, quero trabalhar para um dia poder comprar uma casa, um carro e cuidar bem das minhas filhas”, conta.
Como Pâmela, muitas meninas se encontram na mesma situação, passando por uma ou mais gestações na adolescência. E, independente da classe social, a gravidez precoce, antes dos 18 anos de idade, pode trazer mudanças radicais para a vida das jovens mães, impactando de forma direta em seus planos para o futuro. No entanto, ao contrário do que se possa imaginar, a gestação na adolescência nem sempre ocorre por um descuido ou por falta de conhecimento sobre planejamento familiar e uso de métodos contraceptivos, o que faz com que a maternidade seja, muitas vezes, parte do projeto de vida destas meninas.
Essa conclusão faz parte de uma pesquisa feita com adolescentes grávidas, com idades entre 14 a 18 anos, moradoras de Colombo, na região metropolitana de Curitiba. No estudo, as pesquisadoras dos cursos de Serviço Social, Psicologia e Enfermagem da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) entrevistaram 71 adolescentes da cidade, que são atendidas pela Maternidade Alto Maracanã, para compreender os motivos que fazem com que os índices de gestação sejam altos entre elas.
Para a coordenadora da pesquisa, a professora curso de Serviço Social da PUCPR Ilda Lopes Witiuk, o estudo pretendia avaliar se essas gestações decorriam da falta de conhecimento sobre anticoncepcionais, se elas não utilizavam nenhum método em função da família não saber que tinham vida sexual ativa, se era a falta de proteção no auge do impulso e do desejo ou se tratava-se de uma forma de ingressar na vida adulta. E, de acordo com as respostas coletadas, constatou-se que formar uma família, casar cedo e ser mãe na adolescência é algo comum e natural para essas meninas, que não têm o estudo e o desenvolvimento de carreira como meta, principalmente, por falta oportunidades.
“O casamento precoce e a maternidade são uma maneira de se inserirem na vida adulta e também de terem um papel mais importante em suas famílias, deixando de ser filhas e a passando a ser mulheres. Na pesquisa, percebemos que quase todas as gestantes já eram casadas antes de engravidar ou casaram-se antes do nascimento do bebê. Das 71 entrevistadas, 40 eram casadas, 16 se casaram com o pai da criança e 15 permaneceram solteiras. Contudo, na maioria dos casos, elas não formam novas famílias, apenas passam a morar com a família do marido, entrando para a vida adulta, mas ainda de maneira dependente”, diz Ilda.
A coordenadora acrescenta que isto também é a reprodução de fenômeno cultural, já que 84% das mães dessas adolescentes também foram mães adolescentes. “As mães delas também se casaram e engravidaram cedo, é um ciclo”. Quando o assunto são os planos para o futuro, 60% das meninas afirma que pretende trabalhar, mas a maioria não pensa em voltar a estudar.
Como Pâmela, muitas meninas se encontram na mesma situação. Foto: Ciciro Back |
Pulando etapas importantes do desenvolvimento pessoal
Sobre esses dados a professora do curso de Psicologia e orientadora do estágio na Maternidade Alto Maracanã, Patrícia Guillon Ribeiro, avalia que a g,ravidez, embora precoce, é uma escolha dessas meninas que, normalmente, têm relações estáveis e engravidam como parte “natural” do processo de constituir família. “Entendo que essas meninas buscam nessas relações o que não tiveram com uma figura paterna. Elas buscam, além do afeto, a proteção e a liderança de um homem mais velho que se responsabilize por elas e por seus bebês,” esclarece. Entre os maridos, o perfil encontrado foi de homens entre 20 e 28 anos – em somente em cinco casos, o pai era menor de 18 anos.
Para a psicóloga, as consequências de deixar de viver as descobertas da adolescência são percebidas no futuro. “A adolescência é um conceito social que não é vivido nas comunidades mais humildes. Assim como suas mães, essas meninas saem da infância direto para o mundo adulto. E essa queima de etapas compromete o futuro delas. São meninas que, como precisam cuidar de seus filhos, não se profissionalizam, não têm o direito à continuidade do estudo e as chances de saírem desse ciclo de risco é mínima”.
Patrícia ainda alerta que o início precoce da vida sexual, que, entre as entrevistadas, se deu com idade entre 10 a 14 anos, gera comprometimento físico e emocional. “O comprometimento físico acontece na medida em que o corpo ‘ainda não está pronto’ para determinadas experiências. No que diz respeito ao desenvolvimento emocional, essas meninas ‘queimam etapas’”. Quanto aos riscos físicos, especialistas da área médica afirmam que o maior deles é o baixo peso dos bebês, já que mães e o feto, ambos em fase de desenvolvimento físico, entram em uma espécie de concorrência nutricional durante a gravidez.
A pesquisa ainda contou com a orientação da professora do curso de enfermagem Maria Helena Leviski Alves. Em breve, ela e as demais orientadoras pretendem estender a pesquisa para as cidades de Piraquara e Fazenda Rio Grande. Os resultados coletados devem ser parte de um livro, com propostas de novas politicas públicas sobre o assunto.