Amazônia

Justiça avalia casos de abusos contra meninas indígenas

A Justiça do Amazonas iniciou nesta quinta (18) na Comarca de São Gabriel da Cachoeira (distante a 860 quilômetros de Manaus, fronteira com a Colômbia) a audiência de instrução na qual serão ouvidas as vítimas, as testemunhas de acusação e defesa e os nove acusados por crimes de violência sexual e abusos contra meninas indígenas. A virgindade delas era trocada por dinheiro,  roupas, celulares e até bombons e frutas. O décimo acusado, o comerciante Marcelo Carneiro Pinto, está foragido da Justiça há três meses.

A audiência de instrução, que é o último ato de coleta de provas antes do julgamento do caso, será coordenada pelo juiz Diego Brum Barbosa, titular da Comarca de Santa Isabel do Rio Negro, cidade vizinha de São Gabriel da Cachoeira. Ele assumiu o processo criminal este ano depois que a juíza Tânia Granito se considerou impedida de julgar o caso, uma vez que um parente dela era advogado de acusados pelos crimes.

Os crimes contra 12 meninas indígenas com idades de 9 a 15 anos foram denunciados pela missionária italiana Giustina Zanato, da Congregação das Irmãs Salesianas, à Polícia Civil de São Gabriel da Cachoeira, em 2008. Devido ao poder econômico e político dos envolvidos, os três inquéritos abertos não prosperaram, ficando os acusados na impunidade. Só em 2012 é que os casos chegaram ao Ministério Público Federal, quando o procurador da República Julio Jose Araújo Junior pediu investigação da Polícia Federal. Em 2013, a PF prendeu os dez acusados durante a Operação Cunhantã.

Quatro meninas indígenas foram ameaçadas de morte, assim como a missionária Giustina Zanato, que foi transferida pela Igreja Católica para Moçambique. Ela disse à reportagem que não foi convocada pela Justiça para depor na audiência de instrução.

Apesar da repercussão nacional dos crimes, avaliados pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) como “trágicos” pela violação dos direitos humanos e exploração sexual contra meninas indígenas de etnias vulneráveis, ainda é difícil ouvir as autoridades envolvidas na investigação. A agência Amazônia Real fez um esforço para relatar esta fase do processo, mas não conseguiu saber quantas pessoas serão ouvidas e se os acusados presos foram deslocados para São Gabriel da Cachoeira, por exemplo.

Em entrevista por telefone à Amazônia Real, o juiz Diego Brum Barbosa disse que “se tudo der certo”, todas as pessoas envolvidas no caso serão ouvidas. Ele afirmou que o tempo de audiência de instrução deverá durar uma semana. E preferiu não informar quantas pessoas darão depoimento.

“Todas as pessoas arroladas serão ouvidas. Estou dependendo de que elas compareçam”, disse Barbosa, que não respondeu às demais perguntas da reportagem enviadas por email para a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Amazonas.

Indígena espera por Justiça

A secretária da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira (UMIAB), Mariazinha Cordeiro, da etnia Baré,  afirmou à Amazônia Real que aguarda que os acusados sejam julgados e condenados.

“Muitas pessoas pensam que pelo fato de serem bem sucedidas acham que nunca serão punidas. Mas isso depende da própria Justiça. O poder financeiro não está acima da Justiça. Espero que este caso não fique impune. E que as pessoas sejam presas e as que estão presas continuem no lugar que estão. Diante de fatos ruins, este caso envolvendo a prisão dessas pessoas que exploraram as meninas indígenas é um fato bom”, disse Mariazinha Cordeiro, que é natural de São Gabriel da Cachoeira.

A liderança indígena disse que espera que a justiça “v&aa,cute; até o final” e que o caso não “pare no caminho”.

“Caminhava para ser mais um caso que poderia ficar impune. Tinha gente que nem acreditava que poderia acontecer alguma coisa. Mas logo em seguida as pessoas foram presas. Demorou, mas é importante para que seja tomado como exemplo e que esta prisão e o julgamento ajudem a inibir e a acabar (com a exploração sexual)”, disse.

Segundo Mariazinha Cordeiro, apesar da repercussão do caso, incluindo a prisão do grupo, a prática de exploração sexual continua, embora em menor intensidade. “O grupo que controlava a rede de exploração foi preso, mas deixou raízes. E o grupo que provocava isso deixou problemas sérios nas famílias. Algumas das vítimas se suicidaram”, afirmou.

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