De uns anos para cá, muito tem se falado a respeito de assédio moral no trabalho. Agora, o assunto volta a atrair atenções devido a uma referência clara na novela Amor à Vida. Não se sabe ainda se o autor Walcyr Carrasco vai aprofundá-lo, incluindo-o na lista de assuntos polêmicos abordados em sua obra. Mesmo assim, a situação da secretária Simone (Vera Zimmermann) merece destaque e pode servir para provocar uma reflexão em relação a essa questão. Especialistas afirmam que o sexo feminino é quem mais sofre com o assédio moral.
“Como a legislação trabalhista prevê uma proteção maior para as mulheres, como a estabilidade no período de gestação, a licença-maternidade e o direito a intervalo para amamentação, as mulheres são as principais vítimas. Essa violência ainda se estende a outras questões referentes à maternidade, como o fato de as mulheres faltarem mais para atender às necessidades dos filhos, e tem ainda a questão da TPM, que pode fazer da mulher alvo de piadinhas e brincadeiras”, revela o advogado trabalhista e professor da FAE, Sérgio Rocha Pombo.
Mas o que caracteriza o assédio moral, afinal? A advogada trabalhista e pós-doutora em Direito do Trabalho Leda Maria Messias da Silva, afirma que a grande diferença entre o assédio e o dano moral está na frequência com que as humilhações acontecem. “Nos casos de assédio, as humilhações ou situações constrangedoras acontecem repetidas vezes. Para o psiquiatra alemão radicado na Suécia Heinz Leymann, um dos primeiros a estudar essa questão, essa exposição deve durar seis meses para caracterizar assédio, mas não concordo com isso, pois creio que tudo depende da gravidade da ação”, afirma.
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Cadela é apenas um dos nomes pejorativos que Félix (Mateus Solano) usa para chamar sua secretária, Simone (Vera Zimmermann). |
Essas situações constrangedoras não acontecem necessariamente na frente de colegas – na maioria das vezes, elas são até veladas, pois os assediadores não querem que outras pessoas saibam desta violência. No entanto, nem todo assédio acontece de forma vertical descendente (quando o chefe assedia o funcionário), como neste caso. “A violência pode ser também vertical ascendente (dos funcionários para o chefe), horizontal (entre colegas de trabalho) ou institucional (quando a empresa possui métodos de trabalho que se caracterizam como assédio, principalmente nos casos em que é exigido cumprimento de metas)”, comenta Leda.
As consequências para quem sofre o assédio incluem, além da demissão (voluntária ou não), diversos problemas de saúde, como perda de memória, baixa autoestima, depressão, entre outras. “A Organização Mundial da Saúde (OMS) prevê um aumento das doenças profissionais nos próximos anos. Mas homens e mulheres sofrem de maneiras diferentes, segundo estudo de Margarida Barreto. Elas têm mais crises de choro, palpitações, tremores, sentimento de inutilidade, diminuição da libido e tonturas. Por sua vez, eles têm mais depressão, aumento da pressão arterial e ideias de suicídio”, revela o advogado. Não é à toa que, em 2009, o Ministério da Saúde lançou a cartilha Assédio Moral – Violência e Sofrimento no Ambiente de Trabalho.
Punições podem ser várias
De acordo com Pombo, de cada dez reclamatórias trabalhistas, pelo menos sete incluem pedidos referentes a assédio moral. No entanto, esta não é a única forma de exigir que o ,assediador seja punido. Apesar de a legislação brasileira não entender o assédio moral como crime, diferente do assédio sexual, existem algumas formas de fazer com que o assediador sofra algum tipo de penalidade, segundo Leda.
São dois os principais caminhos: enquadrar o assédio como crime e/ou dano moral. “Muitas vezes, essas humilhações podem ser classificadas como crime contra a honra ou constrangimento ilegal. Neste caso, o julgamento segue os preceitos do Código Penal. Por outro lado, o assédio também pode ser enquadrado como danos morais e materiais, sendo julgado com base no Código Civil”, diz a advogada.
O problema é que o julgamento desses casos é muito subjetivo. “Recentemente, tivemos uma decisão da 2ª turma do Tribunal Regional Federal (TRF), referente a um caso aqui de Curitiba, em que o funcionário assediado recebeu uma indenização de R$ 15 mil por ter sido chamado de vadio, vagabundo e ladrão. Mas esse valor poderia ser maior ou menor, de acordo com o entendimento do juiz. Normalmente, quanto maior a empresa, maior o valor, pois as indenizações também têm caráter pedagógico”, analisa Pombo.
Para obter algum resultado na Justiça, a vítima deve comprovar que sofreu assédio, por meio de provas, como testemunhas,
e-mails, bilhetes, anotações e gravações, desde que elas tenham sido feitas pelo próprio trabalhador que sofreu a violência. “Vale também fazer um diário com todas as informações referentes ao assédio anotadas de forma detalhada”, orienta Leda. Para facilitar os julgamentos, a advogada e algumas colegas da área do Direito do Trabalho lançaram recentemente o livro Assédio Moral no Ambiente de Trabalho – Um proposta de criminalização, em defesa da criação de uma legislação que trate o assédio moral como crime.