Não era um jogo. Era uma guerra. E havia razão. Era o título do cinquentenário do Campeonato Paranaense a decidir naqueles dias de março e abril de 1966. Três equipes lutavam pelo cetro: Grêmio de Maringá, campeão da temporada anterior, representando o Norte Novo, Clube Atlético Cambará, representando o Norte Velho; e o Clube Atlético Seleto, do Sul. O rubro-negro conquistara para o Litoral no dia 7 de março, ao vencer o Água Verde por 1×0 no estádio Paula Xavier, em Ponta Grossa, o inédito título de campeão e ambicionava encerrar a hegemonia norte-paranaense no futebol estadual. O título do Seleto tinha algo de épico, pois foi conquistado na quinta partida entre as duas equipes. Faltava um degrau para a glória.
Nas duas primeiras rodadas, Grêmio e Seleto mostraram que eram as equipes mais qualificadas. O Grêmio venceu o Cambará em Maringá por 2×1, no dia 14, dois gols de Edgard, num jogo em que o quarto-zagueiro Roderley brilhou nas bolas pelo alto e jamais brincou em serviço, como observou a Tribuna na edição do dia seguinte. No outro domingo, dia 21, no estádio Orlando Matos, em Paranaguá, o Seleto passou por cima da Cambará por 3×1, gols de Sinésio contra, Quarentinha e Benê. O jogo seguinte, no dia 28, seria uma guerra. E foi. O atacante alvinegro Edgard abriu a contagem aos 9 minutos do primeiro tempo, mas Quarentinha empatou logo depois aos 21 minutos.
No segundo tempo Chapadão fez aos 27 minutos e aí aconteceu um incidente que deu ainda mais moral ao time de Paranaguá: o zagueiro Pinduca, do Grêmio, foi expulso. Houve um sururu tão grande que o jogo quase foi suspenso. Depois disso, o Grêmio não conseguia achar o caminho do gol. Até que numa jogada, o lateral Nilo foi até a linha de fundo e cruzou para a grande área e o quarto-zagueiro Roderley, bem colocado, escorou aos 38 minutos para os fundos das redes de Pedrinho. “Eu meti a moringa e empatei. Aí aconteceu um negócio que me deixou revoltado”, diz Roderley. “Eu fui comemorar com o Nilo e veio uma garrafa voando da arquibancada direta na cabeça dele. Eu segurei a garrafa e joguei fora. O João Paulino (ex-prefeito de Maringá), que estava no banco, levou uma garrafada nas costas”, diz ele. O juiz Ivan Alves Pereira estava mais perdido que cego em tiroteio e era o mais interessado no fim da partida.
Depois daquele gol, o time do Grêmio perdeu o interesse na partida. Toda bola que aparecia, era rifada para fora do campo, irritando o time do Seleto e a torcida parnaguara. Até que o jogo acabou e os torcedores do Seleto passaram a torcer por um tropeço do Grêmio em Cambará, no jogo seguinte, dia 4 de abril. O Grêmio foi a Cambará, num jogo difícil que estava empatado até os 38 minutos do segundo tempo, quando Edgard fez um belo lançamento para o centroavante Walter Prado que mandou para os fundos das redes. O time de Maringá somava cinco pontos, contra três do Seleto, que precisava ganhar ou no mínimo empatar o jogo no dia 11 de abril contra o Galo do Norte, para ir a Cambará na quarta-feira seguinte, dia 14, para derrotar os anfitriões por qualquer resultado e ser campeão. O jogo decisivo mesmo, todos sabiam, era do Willie Davids.
Então aumentaram as provocações que começaram antes da primeira partida, quando o ponta-direita Iauca disse que “Cambará e Grêmio não são o bicho papão que andam apregoando por ai. Pelo menos a mim não assustam”. E houve o episódio depois do segundo gol em Paranaguá. Roderley foi provocado e deu uma declaração explosiva: “O time do Grêmio é melhor, vai ganhar e eu ainda vou sentar na bola”. O jogo em Maringá num domingo ensolarado estava até tranquilo. Aos 11 minutos do primeiro tempo, o ponta-direita Danúbio cruzou e encontrou o meia Zuringue na entrada da área. Ele emendou uma patada de esquerda e abriu a contagem para o Grêmio. No segundo tempo, Walter Prado fez o segundo.
No entanto, quando o jogo estava chegando ao final, Roderley cumpriu a promessa. Sentou na bol,a diante do adversário, três vezes, abriu os braços numa provocação e quando o adversário avançou, ele passou a abola para Edson Faria, que repetiu o gesto e Pinduca não fez o mesmo porque o passe de Faria foi forte e ele perdeu o tempo da bola. O juiz Manoel Varga, o Manolo, não fez nada e o protesto foi geral. A Tribuna considerou “deplorável” o gesto do zagueiro alvinegro, feito para diminuir o rival. Terminada a partida, o Grêmio era bicampeão. Ganhou o título do cinquentenário do futebol paranaense. Quanto a Roderley, aquele não foi o primeiro e nem seria o último gesto de rebeldia e irreverência.