O Atlético teve a ideia de fazer uma peneirada em 1957 e num golpe arrebanhou o maior número de futuros craques em uma só jogada, fato inédito em sua história. Entre eles, estava Amauri, garoto negro, magro, alto e tímido que jogava no Flamengo de Santa Quitéria. “Eu tinha treze anos e no Flamengo eu jogava de meia-direita e era artilheiro. Pedrinho, do Asa Futebol Clube, era meu amigo e insistiu para eu ir. Nós estudávamos no Colégio Bom Jesus. Seria um torneio mas na realidade era uma peneirada disfarçada de campeonato que o Atlético ia fazer em um só dia”, diz Amauri. Ele ficou ressabiado e não quis ir. Entre os motivos da recusa estava um de ordem prática: “Eu não tinha chuteira. Um amigo disse que emprestava. Então eu fui”, diz ele.
Chegando lá, tinha uma multidão de garotos e a disputa pelas camisas não fácil, Amauri era tímido e ficou na dele. “Eu era um crioulinho que estava ali. Quando começaram a distribuir as camisas, elas foram saindo e já estava no quinto time, que seria o último e eu percebi que as camisas para meio-campo e para ataque já tinham acabado”, conta ele. “Sobrou apenas a de lateral-esquerdo. Aí alguém gritou, tem algum lateral-esquerdo por aí? Eu não queria ficar fora das partidas que iam ser disputadas e disse, eu sou lateral-esquerdo”, diz ele. Foi a sorte de Amauri. “Como eu era atacante e conhecia as manhas de atacante eu não apenas defendia como eu descia para o ataque. Então eu comecei a fazer involuntariamente aquilo que o Cláudio Coutinho veio chamar de overlaping quinze anos depois. Se for levar ao pé da letra, eu posso dizer que sem querer eu inventei o overlaping, porque eu já fazia em 1957 aquilo que o Coutinho foi pedir bem depois”, conta Amauri.
Talvez se ele tivesse sido escalado para o ataque ou para o meio campo ele não teria feito tanto sucesso. “O certo é que com liberdade para descer, atacar e cruzar eu acabei escolhido o melhor jogador daquela peneirada que ficou marcada na historia do Atlético”, diz ele. Além de Amauri, o grupo de garotos que entrou para o time mirim do Atlético Paranaense tinha ainda outros garotos que vieram a fazer parte do rubro-negro da Baixada nos anos 60 e começo dos anos 70. Estavam lá Alfredo Gotardi, Pedrinho, Renatinho, Adilson, além de Raul Plassmann. “Desta relação, todos foram para ao time titular do Atlético alguns anos depois, com exceção do Raul Plassmann”, conta Amauri. “O Raul da noite para o dia assinou com o Coritiba. Quem levou o Raul para o Coxa foi o Miguel Checchia. Isto foi em 1962”, conta ele.
A mudança repentina e surpreendente na época não passou em branco. “Foi um escândalo. O Raul ficou muito marcado com a torcida do Atlético. Foi o único juvenil da turma de 57 que não assinou com o Atlético”, diz Amauri. “Nós também ficamos impressionados porque nós éramos muito unidos. E quem ficou no Atlético continuou unido e jogando junto por muito tempo. E eu fiquei titular absoluto do Atlético por muitos anos, até 1968, quando eu me machuquei e tive que passar por uma cirurgia”, acrescentou. No entanto, antes de ir para o time titular, por volta de 1962, os garotos da peneirada ainda tiveram chance de deixar seus nomes marcados na história do Atlético ao conquistar o título inédito de campeões juvenis em 1961 e repetir a dose no ano seguinte. Ainda em 1962, Amauri esteve na Seleção Amadora do Paraná que disputou o Campeonato Brasileiro no Rio de Janeiro. “Nesta competição estava a nata dos jogadores que viriam a se destacar no futebol brasileiro naquela década, como Jairzinho do Botafogo, pelo Rio de Janeiro e Rivellino, do Corinthians, por São Paulo, os dois times que fizeram a final”, conta Amauri.
O Paraná fez bom papel. “Nós fomos até a semifinal contra São Paulo. No tempo normal houve empate sem gol, na prorrogação houve empate em quatro gols e perdemos a vaga na final no cara e coroa que a gente suspeita ter ganhado, mas o juiz na hora escondeu a mo,eda na mão e disse que foi São Paulo. Ele jogou, pegou no chão, abriu a mão e disse: Paraná. Quero dizer, São Paulo. Houve protesto, mas não adiantou”, diz Amauri. Na disputa pelo terceiro lugar o Paraná entrou com o time reserva e perdeu para Santa Catarina. “Deste jogo eu lembro que o goleiro catarinense era o Jairo que veio a se destacar anos depois no Coritiba”, conclui Amauri. Depois desta competição, a sua estreia como profissional era questão de tempo. E ela aconteceu meses depois num amistoso do Atlético em Santa Catarina contra o Marcílio Dias. O Atlético venceu por 5×2.