Joel Mendes deixou Curitiba para ganhar o mundo

Se fosse resumir a carreira do goleiro Joel Mendes, é possível dizer que ele começou a jogar futebol no Trieste de Santa Felicidade, onde foi campeão em 1964, no primeiro título do tradicional clube amador de Curitiba. Depois foi para o Coritiba, onde um de seus feitos foi pegar um pênalti de Uwe Seeler, um dos maiores atacantes da seleção alemã, e que nunca tinha errado pênalti na vida. O jogo aconteceu em Hamburgo, na primeira partida da primeira excursão de um time paranaense na Europa. A torcida alemã se levantou e o aplaudiu. Ele era titular do Coxa e sua carreira embalou de tal forma que em 1970 estava jogando ao lado de Pelé, onde ganhou, para o resto da vida, o direito de dizer que atuou no melhor time do mundo. “Eu joguei no Santos Futebol Clube de Pelé, Coutinho e companhia”. Como toda história tem um fim, ela terminou em 1983, no Colorado, onde Joel foi o camisa 1 por três anos.

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No tempo do Santos: com 1,78m, Joel fazia malabarismo nas traves.

Só que no meio de uma carreira de 20 anos de futebol, há uma vida intensa de aventuras, glórias, alegrias e, como não podia deixar de ser, alguma tristeza e um e outro vacilo, como o famoso gol do goleiro Zico, numa partida entre Colorado e Cascavel. Então, vamos pelo começo. Joel Mendes nasceu no dia 25 de junho de 1946 em Campo Magro, que à época pertencia ao município de Curitiba. “Meu pai era caminhoneiro. Ele trabalhava com o transporte de inflamáveis. Como o depósito de combustíveis ficava no Parolin, em Curitiba, ele decidiu mudar para Santa Felicidade, para ficar mais perto do ambiente de trabalho. Eu tinha dez anos nesta época, jogava futebol nos campinhos perto de casa, até que aos quinze anos eu fui para o Trieste”, diz. Como naquele tempo as coisas eram rígidas, precisou que o pai assinasse autorização.

Joel começou nas equipes inferiores chamadas “cascudos” e com 18 anos era o goleiro titular do tricolor de Santa Felicidade. “Fomos campeões em 1964. Um título que causou grande repercussão em Curitiba”, afirma. Foi a primeira conquista do Trieste. O time fundado em 1937 nunca havia sido campeão. Antes, o Trieste havia sido cinco vezes consecutivas vice-campeão. Outro motivo é que o Trieste foi campeão em cima do Real, que tinha um monte de ex-profissionais, como Galalau – daquele time do Furacão de 1949. “Ganhamos o primeiro jogo por 2 x 0 no campo do Trieste e o segundo por 1 x 0 no campo do Água Verde. Com um detalhe: neste último jogo eu peguei um pênalti”, conta Joel Mendes.

Aplaudido de pé pelos alemães

Um goleiro jovem e jogando bem não ia ficar por aí sem despertar a atenção. O Coritiba botou olho no garoto do Trieste e o contratou. Joel Mendes acertou no dia 18 de janeiro de 1965, para ocupar o lugar de Raul Plassmann, que foi vendido para o São Paulo. Mas como nesta época Joel Mendes estava na idade de servir o exército, de 1965 para 1966 ele alternou quartel e campo de futebol. Passou mais de um ano treinando para estrear no Coxa num amistoso contra o Seleto de Paranaguá. “Quando eu dei baixa no quartel, então comecei a treinar como manda o figurino. Pesado mesmo. Fui titular do Coritiba. Em 1967, perdemos por 1 x 0 para o Paraná, de Londrina, e deixamos o título escapar. Mas no ano seguinte fomos campeões”, recorda.

A temporada de 1968 foi extraordinária para o Coritiba, mas também importante para Joel Mendes. “Primeiro porque o clube trouxe um grande goleiro que era o Célio. Ele foi titular e eu fui para a reserva. Foi bom para mim. Ganhamos o título estadual e o Atlético, que estava montando um time forte para disputar o Roberto Gomes Pedrosa, que era o Campeonato Brasileiro da época, levou o Célio e o Nilo emprestados. Com isso, voltei a ser titular no Coritiba”, recorda.

Com o fim do Roberto Gomes Pedrosa de 1968, Célio voltou para o Cor,itiba e foi para a reserva. Na condição de titular, Joel foi para a Europa na primeira excursão de um clube paranaense àquele continente. “Na primeira partida na Europa, contra o Hamburgo, um dos melhores times da Alemanha na época, e que tinha diversos jogadores da seleção vice-campeã mundial de 1966, o juiz Frederik Furkst apitou um pênalti num carrinho do Nico em Steiner, que havia tropeçado”, recorda Joel Mendes.

Escalado para a cobrança, o atacante Uwe Seeler, considerado um dos melhores jogadores de sua geração e ídolo alemão, que nunca tinha perdido pênalti, bateu no canto. “Eu voei e toquei com a ponta dos dedos. Ela bateu na trave e saiu”, recorda. A plateia alemã no Volksparkstadion se levantou e aplaudiu o goleiro paranaense. A partida, realizada em Hamburgo no dia 30 de julho de 1969, terminou 1 x 1.

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Joel Mendes: ida ao Santos rendeu fortuna ao Coritiba.

Recomendado pelo Rei Pelé

No Roberto Gomes Pedroza de 1969, Joel Mendes era o titular do Coritiba em um duelo contra o Santos. Embora o time de Pelé tenha ganhado o jogo por 3 x 1, o goleiro do Coxa foi bastante elogiado. Na realidade, a partida disputada no dia 22 de outubro de 1969 serviu também para o Coxa receber as faixas de bicampeão estadual. Pelé marcou dois gols, mas o grande medo dos goleiros na época era sofrer o milésimo gol que Pelé viria a marcar quase um mês depois, de pênalti, num jogo contra o Vasco. No entanto, foi depois do jogo contra o Coritiba que o Santos decidiu contratar o goleiro do paranaense. “Pelé sugeriu que o Santos me contratasse para o lugar do Cláudio. Na realidade, muitos times, como o Grêmio de Porto Alegre, estavam interessados em me contratar”, diz Joel Mendes. Na época, a negociação foi considerada a maior negociação do futebol paranaense. O Santos pagou 300 mil cruzeiros, mandou três jogadores para o Coritiba (Hermes e Werneck, em definitivo, e Oberdan por empréstimo) e ainda se comprometeu a deixar para o Coxa a renda de duas partidas amistosas, e com a presença de Pelé. “Assim, em 1970, fui para o Santos para jogar naquele time fantástico ao lado de Pelé, Coutinho, Carlos Alberto e um monte de craques. Eu me lembro muito bem do dia em que isto aconteceu: foi no dia 6 de janeiro de 1970”, recorda. No Santos, o nível era outro. Joel Mendes estava no melhor time do mundo, e de todos os tempos. O time do Rei Pelé. “Eu acho que não vai existir outro como Pelé. Hoje em dia eu vejo estes jogadores que jogam uma bolinha pequena chegando ao aeroporto todo mascarado, pensando que é astro, com foninho no ouvido, todo cheio de marra. Eles não sabem o que é ser astro. Pelé era. Quando a gente chegava num lugar, a loucura começava na pista do aeroporto. Tinha que reservar área para o Pelé dar entrevista. Estava cheio de gente querendo tocar no Pelé. Alguns passavam a mão em sua cabeça e ele ficava louco. Se tinha uma coisa que Pelé não gostava era que passassem a mão em sua cabeça”, diz Joel Mendes.

Jogar no Santos era algo simplesmente diferente de tudo o que ele viu. Na hora do treino, para onde ele olhava, só tinha feras. “O time inteiro era muito bom”, lembra Joel Mendes, que com seu 1,78m fazia malabarismo debaixo das traves para ser o titular.

Glórias e tristezas no Nordeste

No Coritiba, Joel Mendes jogou de 1965 a 1970. Ficou no Santos de 1970 a 1975, quando foi emprestado para o Vitória. Após um Campeonato Brasileiro excelente, voltou ao Santos e foi vendido para o Bahia em 1976. ‘Joguei um campeonato e meio e fui vendido para o Santa Cruz. Ainda assim eu fui campeão duas vezes pelo Bahia. Estive no título do tetracampeonato e do pentacampeonato estadual’, recorda. Em 1978 e 1979, foi campeão pelo tricolor pernambucano.

No final do ano do segundo título, então aconteceu aquilo que ele considera talvez o episódio mais triste de sua carreira. E que acabou motivando o seu retorno para o Paraná. ‘O Santa Cruz tinha vencido os dois primeiros turnos e estava decidindo o terceiro contra o Náutico para ser campeão. O time do Santa Cruz era muito s,uperior. Mas na primeira partida, o Náutico ganhou por 1 x 0. Fui pegar a bola, escorreguei e ela entrou. Um conselheiro começou a espalhar o boato de que eu facilitei o gol do Náutico. Ele insinuou que eu estava na gaveta’, conta Joel.

O goleiro revoltou-se, não atuou no segundo jogo da final, que o Santa Cruz ganhou por 3 x 1, e rescindiu seu contrato com o clube. ‘No dia seguinte, fui lá no clube e pedi o passe livre para terminar a minha carreira no Colorado’, recorda Joel Mendes.

Levou gol de goleiro

Joel Mendes também esteve no centro de um episódio folclórico, que é o famoso gol de goleiro. Isto aconteceu no dia 16 de novembro de 1980, pelo primeiro turno do quadrangular final do Campeonato Paranaense, no estádio Theodoro Colombelli, em Cascavel. Jogavam Colorado e Cascavel. A Cobra vencia por 1 x 0, quando o goleiro Zico foi repor a bola em circulação, provavelmente tentando fazer a famosa ‘ligação direta’. Ele pôs tanta força no chute que a bola atravessou o campo, quicou na frente de Joel Mendes, bem na linha grande área e encobriu o goleiro. ‘Levei um susto quando a bola entrou’, resigna-se Joel Mendes.

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